ECO/CUT 27 ANOS: Do ABC do Trabalhador à Pedagogia do Cerrado

É com muito prazer que recebo e aceito o desafio de reescrever este texto sobre a trajetória da Escola Centro Oeste de Formação a CUT Apolônio de Carvalho – ECO-CUT: “Do ABC do Trabalhador â Pedagogia do Cerrado”. A primeira versão do mesmo foi escrita nos 20 anos da escola, quando se encerrava meu vínculo como Educador Sindical. Foram sete anos de muito aprendizado, muitos processos coletivos de construção do conhecimento acerca do sindicalismo brasileiro. Momentos intensos de trocas e compartilhamentos de saberes inspirados na concepção dialógica de Paulo Freire que nos fizeram crescer, amadurecer e compreender nossos desafios, inspirações e contradições forjadas na luta de classes e nas nossas ações quanto base e direção sindical. Mais que isso, a experiência na ECO-CUT contribuiu significativamente na construção do educador que me tornei, pois tem muito de ECO-CUT em minha prática docente. E, assim, acredito que muitos e muitas que passaram pela formação sindical nesses 27 anos de escola sindical também tenham carregado algo da Pedagogia Sindical, mais especificamente da Pedagogia do Cerrado da ECO-CUT em seu legado social.

A Escola Centro Oeste de Formação da CUT Apolônio de Carvalho é fruto de um processo histórico que se inicia com a necessidade de construir uma unidade de concepções e princípios de luta da classe trabalhadora vinculada aos sindicatos e federações de sua base que levasse em consideração as diversidades regionais, mas que também considerasse o princípio classista da Central Única dos Trabalhadores. Propor uma formação integral dos trabalhadores e trabalhadoras para participarem dos processos políticos de intervenções junto à categoria e â sociedade de forma geral. É neste momento que surge o Projeto “O ABC você já conhece” como primeiro passo para criação da Escola Centro Oeste de Formação Sindical ainda no início dos anos 1990.

O nível de capacitação entre os(as) trabalhadores(as) da Região é bastante diversificado no que diz respeito ao preparo para organizar lutas por melhores condições de vida, especialmente com relação às concepções cutistas. (ECO-CUT, 1993, p. 1)

O desafio foi posto. É sabido que em um país de dimensões continentais como o Brasil, as diferenças regionais são consideráveis em todas as suas dimensões naturais e sociais. A cultura política é uma dimensão social marcante nas regiões brasileiras e, assim como as relações de trabalho, é carregada de elementos da cultura local. Desta forma, a luta da classe trabalhadora, mesmo que tenha uma unidade nacional, possui suas especificidades regionais que precisam ser levadas em consideração no planejamento das ações dos sindicatos e federações e a construção de um espaço para que as especificidades regionais fossem trabalhadas e compartilhadas no conjunto de trabalhadores e trabalhadoras de cada região se fez necessária. Assim, o coletivo responsável pela proposta da Escola Centro Oeste justifica sua criação.

Esta situação é agravada pela falta de um espaço específico de formação, que tenha a preocupação com a discussão e o encaminhamento das prioridades nacionais e as exigências regionais, assumidos concretamente pelos militantes envolvidos na realidade local, considerando-se a formação sindical como tarefa orgânica, encaminhada coerentemente com as especificidades, necessidades e exigências dos (as) trabalhadores(as) (ECO-CUT, 1993, p. 4).

Neste sentido, a Escola Centro Oeste de Formação Sindical da CUT Apolônio de Carvalho, vem, ao longo de seus 27 anos, desenvolvendo atividades de formação sindical levando em consideração as dimensões culturais, ambientais, econômicas e políticas do Centro Oeste e ao mesmo tempo fortalecendo a unidade CUT com seus princípios e concepções.

Neste ano em que a Escola Centro Oeste de Formação Sindical da CUT Apolônio de Carvalho completa 27 anos de atuação nos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Goiás e no Distrito Federal é momento de fazermos nossas reflexões sobre nossa prática pedagógica junto à classe trabalhadora ao longo desses anos. É importante destacar a construção social e coletiva do conhecimento daqueles e daquelas sindicalistas que passaram pela formação ECO-CUT. Há sete anos, a Escola completava 20 anos de atuação na formação sindical e lançava a revista de 20 anos em que falava da construção de uma proposta pedagógica denominada de “Pedagogia do Cerrado”.

Ao longo desse tempo de atuação, a Escola Apolônio desenvolveu ações no campo da organização sindical e da atuação na sociedade. Uma escola de dirigentes preocupada não apenas com a preparação de seus educandos para o dia-a-dia burocrático do sindicato, mas que possam analisar a conjuntura de seus momentos, possam disputar políticas públicas para o desenvolvimento local e desenvolvam a capacidade de elaborar planos e projetos de ação sindical. Tudo isso, levando em consideração a luta de classes e as mudanças no mundo do trabalho nas últimas décadas.

A concepção de “Pedagogia do Cerrado” vai além de uma frase de efeito para expressar uma identidade regional à qual estamos ligados por meio do bioma natural que se faz presente em todos os nossos estados e Distrito Federal. A Pedagogia do Cerrado é o resultado do acúmulo de experiências pedagógicas que proporcionaram um conjunto de procedimentos metodológicos e referenciais teóricos baseados na conexão de saberes existentes nos espaços formativos da Escola. Ela é, de certa forma, a identidade CUT do Centro Oeste que reflete a luta da classe trabalhadora na relação CapitalXTrabalho numa perspectiva da cultura política, ambiental, econômica, educacional, entre outras dimensões sociais que marcam o “povo cerradeiro”.

Para tanto, não inventamos a roda, apenas colocamos em prática os princípios da Educação Popular, historicamente construídos pelos movimentos sociais do campo e da cidade. Princípios educativos forjados na luta por trabalho digno, moradia, educação; lutas por territórios tradicionais quilombolas e indígenas; por assentamentos da reforma agrária. Lutas que formam pessoas protagonistas de sua própria história. Sujeitos carregados de inteligência e que trazem para a formação suas pedagogias.

As narrativas e depoimentos dos militantes ou as místicas, músicas, análises explicitam que a produção da vida nos cmapos, nas fábricas, na diversidade de formas de trabalho produz um mundo cultural, simbólico, ético, identitário, humano. Produz uma inteligência, um modo de pensar prático/produtivo, criativo, interativo. Todo esse mundo humano, intelectual, ético, cultural se reproduz em interação com o trabalho, mas ao mesmo tempo esses mundos determinam o trabalho, o tornam trabalho humano. Sendo humano é uma atividade cultural. (ARROYO, 2014, p. 101).

Miguel Arroyo, para mim, um dos mais autênticos pensadores freirianos da atualidade, nos fala da pedagogia do mundo do trabalho baseada no cotidiano do homem e da mulher com o trabalho. Sendo assim, o trabalho é princípio formativo e deve ser levado em consideração nos processos educativos da classe trabalhadora na educação acadêmica e/ou popular. Paulo Freire, no decorrer de sua linda trajetória pedagógica, nos ensina que o desvelar da consciência de classes acontece quando reencontramos com os mundos que nos formaram e nos formam. Reencontramos com nossa história carregada de sentidos. Sentidos que encharcam as palavras que aprendemos no “ABC do trabalhador e da trabalhadora”. Só assim a educação se torna libertadora. Nos tira da visão de mundo do opressor.

Uma Pedagogia com base no princípio dialógico de Paulo Freire só poderia resultar numa escola construída por várias mãos. A ECO-CUT Apolônio de Carvalho, é então: “Uma construção de muitas mãos, muitos corações, muitas idéias e muitos ideais com o objetivo de empoderar os trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade no Centro-Oeste do Brasil” (ECO-CUT – Revista A Pedagogia do Cerrado, 2011). Nessa construção coletiva da nossa Escola, deve ser lembrado do compromisso político assumido pelas entidades da região Centro Oeste na efetivação do projeto de formação. As CUTs Estaduais de Goiás, do Mato Grosso, do Distrito Federal, do Mato Grosso do Sul e do Tocantins levaram a sério o projeto da Escola e, junto com à CUT Nacional, representada pela Secretaria Nacional de Formação, colocaram em prática o sonho de construção de um espaço de formação para a classe trabalhadora do Centro Oeste.

No campo da concepção de educação em disputa, as escolas sindicais são responsáveis por apresentar não apenas à base sindical, como também à sociedade em geral, o que vem a ser a educação desejada e defendida pela Central Única dos Trabalhadores: A Educação Integral do Trabalhador e da Trabalhadora que forma não apenas para o mercado, mas para assumir papeis protagonistas na construção de um novo mundo. Uma educação popular que paute a educação formal. Que dispute as universidade e escolas do país. Que lute por um mundo mais igual e menos violento. Uma Educação que vise todas as dimensões do desenvolvimento humano. A Escola Centro Oeste Apolônio de Carvalho, do ABC do Trabalhador à Pedagogia do Cerrado, expressa um universo homens e mulheres que juntos lutam por um mundo melhor no Centro Oeste Brasileiro.

Prof. Mestre em Geografia: Ubiratan Francisco de Oliveira
Professor da UFT – Curso de Licenciatura em Educação do Campo – Artes e Música
Doutorando em Geografia – IESA/UFG

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By ecocut

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